Textos poéticos/contos/crônicas todas terças, quintas e sábados... ou quando a inspiração mandar...

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Cartas de Inverno/Eu

O inverno bate minha porta do quarto com força
Em minha solidão nenhuma leitura ou canção me concentra
Somente o abraço gelado da ventania e o beijar da frieza que transpassa meu telhado

Paz, amor e rock'n'roll tão em falha na estação olindense
Pensei em seguir aquele conselho do Carlos e dançar a valsa vienense
Mas tal qual José, eu sou duro
e também tô duro pra pagar o ingresso no Clube das Pás

"Tudo muda nesse mundo, menos a natureza humana"
Humanamente falando, os humanos me jogaram nessa cela desumana
"O que eu preciso é de mudança no coração"
Mudar de um cômodo vazio pra um que Deus coloque você como inquilina eterna

Essa viagem diária à Torre me deixa tão sem meu castelo particular
Minha válvulas bicúspide e tricúspide perderam a aceleração
Batem cada dia mais lentas e mecanicamente, sem você, motivo de minhas taquicardias

Eu, iceberg, vagando sem rumo e me ferindo nos Titanics
Eu, terreno baldio, desprezado, latifúndio sem uma sem-terra a me cobiçar
Eu, passageiro atrasado num ônibus lotado e ainda assim solitário
Eu, sol, prisioneiro de estratos e nimbos que impedem minha luz e calor te tocarem, minha Terra
Eu, reles olhar perdido admirando tuas sardas sem um olhar de gratidão em retorno
Eu, fóssil vivo-morto exposto do Cretáceo perdido nesse Holoceno obsceno
Eu, inverno, indesejada estação implorando que a primavera ao menos dê-me o sono divino

Ou dê a mim o perfume teu
Minha black rose querida
Quando, de minha ferida, nascerás e sararás
meu sofrido miocárdio?

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