Textos poéticos/contos/crônicas todas terças, quintas e sábados... ou quando a inspiração mandar...

sábado, 16 de abril de 2016

Madrugada de 15 de Abril de 2016


E eu cai
Num profundo abismo sem ver as cores do arco-íris
Pois a escuridão despedaçou o prisma e o facho de luz se perdeu no espaço sideral
Eu caindo
Sem saber onde será o fundo do poço, ou se vão cavar um pouco mais abaixo
Até onde meu corpo como átomo na imensidão do vácuo irá ser sugado rumo a uma fissão nuclear
Minha Nuclear Football caiu nas mãos de presidentes errados
Cabrum, quando virá
Eu cairei

Lá atrás me perseguem os monstros da sociedade esquecida e reinante sobre nós
Eles não me deixam em paz, como pedras rolantes em uma avalanche
Rock'n'roll com suas mandíbulas babando, minha carniça ansiando
Será que há alguma saída, algum esconderijo, ou apenas mais abismos?
Meu outro eu, perverso irmão que deseja se apossar de minha pele e por fim ser eu
A rainha das inseguranças me fazendo devorado por mim mesmo

Meu corpo em exposição, como um animal no zoológico, desnudo
Minhas vergonhas expostas, entranhas, estranhas
Os sorrisos de meus erros e estupideces, agora são risos alheios, alheios à minha dor
Ao meu pânico ao vê-los da minhas inseguranças tecerem a próxima atração do circo Thiani
Impossível pensar em deixar que meu anseio rubro ruivo tivesse o azar de meu eu contemplar assim

De quedas a uma explosão do meu velho Fusca MeiaOito
A culpa sempre foi minha, sempre é, sempre será, não precisa repetir
Acidentes acontecem, mas isso não isenta nossa estupidez
Quando perdi um anel de ouro de tantos quilates aí, ou quando deixei de conquistar sonhos idosos
Não adianta enfiar as circunstâncias no banco dos réus que é todo meu
Veredicto: Culpado
Pena: Capital
Execução: Sumária

Invés da morte, a mutilação
Braços e pernas se vão, em vão, por vãos e grãos de terra os cobrirão
Lívida e vívida esperança decapitada caminha agonizante até que não hajam mais impulsos reflexos
Minha hematridose escorre como suor por meus decepados membros, dores fantasmas, coceiras
Castração, inutilidade, jogado à sarjeta, irmã e mãe dos enjeitados... re-jeitados

Perdido, sem lanterna dos afogados, no mar aberto
Aguardando meu tubarão fazer sua refeição
Hemorragia o atrairá, um deserto d'água, encruzilhada de mil cruzes cruzando-se em circunferência
Quase todos caminhos que segui outrora só me fizeram ficar salobro, pulmões úmidos
Será que haverá ao menos uma praia para morrer por lá?

De repente estou encerrado no presídio da minha mente
A gaiola de um pássaro sem asas da espécie Ego Eu
Contemple cada 2 cm que formam meus 4 cm² de conforto atual
Divido em três paredes e a quarta, você pode vê-la, em forma de barras de ferro
No fim, percebo, essa prisão é subaquática
Minha respiração agonizante se apercebe que escapatória inexiste, hoje, sempre e eternamente
Eu criei minha cela, nela me tranquei e perdi as chaves no mesmo abismo que continuo a cair

Lamúrias do fracasso mandam seus odes, elegias e sonetos de insanidade
Desiluda-se, iluda-se, curvar-se aos dois deuses do dualismo anímico
Bebais meu fluido sanguíneo, vampiro galante e cruel
Com sua capa, tecida em fios de ansiedade, acupuntura a qual só nos traz pontos e cicatrizes
Doloridas recordações tatuadas em nossas faces, fraca-sai

No fim, termina em caixão, complemente "e vela preta"
Vala aberta, seis pés abaixo
Eles me aguardam
Eu cairei
E a pá do coveiro fará meus irmãos, areia, argila e cascalho, caírem logo após a me guiar e cobrir...

A traição, o último pesadelo
Essa é tão sagaz, que por vezes só se revela post-mortem
Quando até mesmo as rosas e crisântemos lançados e que decaíam sobre o sepulcro
Simplesmente desvanecem para sempre junto com recordações, saudades, nada mais, pó e cinza
"Catiti catiti/ Imara Notiá / Notiá Imara / Ipeju"*

Acordei
Mas ainda prossigo com uma sensação que apenas despertei de um pesadelo dentro de outro
Ou vários despertos que se sucederam e me avisam:
Eu ainda posso permanecer caindo...



*"Lua nova, ó Lua Nova! Assoprai em lembranças de mim; eis-me aqui, estou em vossa presença; fazei com que eu tão-somente ocupe seu coração" em tupi-guarani; extraído do Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade, traduzido por Couto Magalhães.

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